Monday, December 25, 2006

Breviário do pensamento cosmológico - os astros invertem posições










No ano de 1543, ano da sua morte, Nicolau Copérnico publica a sua obra De Revolutionibus Orbium Coelestium (Tratado Das Revoluções Do Mundo Celeste), escrita em 1530. E que revolução ele faz no pensamento astronómico da época, baseado no velho sistema de Aristóteles e Ptolomeu, que considerava a Terra o centro do Mundo, à volta do qual orbitavam os outros astros. Para a Igreja de Roma a teoria geocêntrica[1] do Mundo era indiscutível. Copérnico tem nas mãos um exemplar da sua obra poucos dias antes de fechar os olhos, sendo as provas revistas pelo seu discípulo e amigo Rheticus. «Não duvido de que os matemáticos concordarão comigo se quiserem dar-se ao trabalho de tomar conhecimento, não superficialmente mas profundamente, das demonstrações que darei nesta obra», diz Copérnico, falando do seu novo sistema. O seu editor tem a precaução de redigir um prefácio que apresenta o livro mais como uma visão do espírito do que como uma tese científica e Copérnico dedica a sua obra ao Papa!
Homem de grande cultura (estudara Filosofia, Medicina, Farmácia, Matemática, Ciências, Astronomia e Teologia), este polaco nascido em 1473, em Toruñ[2], fora nomeado cónego.
Sem instrumentos de precisão, que não existiam na época, mas fruto da sua reflexão lógica e do estudo de alguns filósofos gregos, antes de Ptolomeu, que tinham concebido a possibilidade de um Mundo heliocêntrico[3], chega à conclusão desconcertante de que a Terra não está no centro do Universo, em torno da qual tudo se move. E prevê que o nosso Planeta realiza um movimento de rotação à volta do seu eixo e um movimento de translação à volta do Sol – acontecendo o mesmo com os outros planetas, embora com velocidades diferentes. A ideia de Copérnico não era propriamente nova! Um sistema heliocêntrico tinha sido proposto por volta de 200 a.C., por Aristarco de Samos[4], embora não tendo sido aceite devido ao peso da doutrina de Aristóteles e do “senso comum”.
O modelo de Copérnico, ao banir a ideia de que a Terra era o centro do Sistema Solar, conduz a uma explicação simples para o movimento retrógrado dos planetas e para a variação do seu brilho: o brilho dos planetas varia conforme a sua distância da Terra e do Sol, e o movimento retrógrado é devido ao movimento mais rápido dos planetas com órbitas mais pequenas.
Copérnico continua, no entanto, a pensar que os planetas descrevem círculos à volta do Sol. Ptolomeu tinha sido capaz de prever a posição de Marte com um erro de pouco mais de 5 graus; Copérnico fê-lo com um erro de um pouco menos de 5 graus. Este continuará a ser um problema até se desmoronar a tradição, velha de dois mil anos, das órbitas circulares. Mas o seu sistema heliocêntrico lança as bases para importantes avanços no conhecimento do Universo...

Copérnico & Galileo

[1] Geocêntrico (Gr. gê, Terra + kénton, centro), adj. diz-se do sistema em que a Terra é considerada como centro dos movimentos dos astros.
[2] Toruñ: cidade nas margens do Rio Vístula, na Posnânia.
[3] Heliocêntrico (Gr. hélios, Sol + kénton, centro), adj. relativo ao Sol, como centro do sistema astronómico.
[4] Samos: ilha perto do que é hoje a Turquia.

Tuesday, November 28, 2006

Parece um monstro mas não é...









As bizarras formas multicolores foram captadas pelo Telescópio Espacial Hubble e são os escombros de uma estrela maciça que explodiu há mais de dez mil anos – uma Supernova –, cuja luz só há cerca de 320 anos começou a chegar à Terra (nos últimos anos do séc. XVII). Aos destroços dessa antiga estrela foi dado o nome de Cassiopeia A ou, abreviadamente, Cas A, e são os mais recentes restos conhecidos de uma Supernova, na nossa Via Láctea. Situam-se a 10.000 anos luz de distância, na constelação Cassiopeia.
Este material pode, eventualmente, ser “reciclado” pela máquina cósmica e utilizado na construção de novas estrelas, planetas.... e até dar origem a vida semelhante à que conhecemos. Alguém disse um dia: «somos pó de estrelas». O Sistema Solar pode ter sido alicerçado nos escombros de estrelas semelhantes, que explodiram há biliões de anos. A estrela que deu origem a este espectáculo colorido era cerca de 15 a 20 vezes mais maciça do que o nosso Sol.


Copérnico & Galileo

Breviário do pensamento cosmológico - o quebra-cabeças do planeta Marte...












Ptolomeu[1] fundamentou um sistema geocêntrico[2] na sua obra intitulada Syntaxis Mathematica ou Grande Astrónomo.
No séc. IX, os astrónomos árabes usavam o superlativo magiste (o maior) para se referir à obra. De magiste, ao qual foi acrescentado o artigo árabe al, surgiu o nome Almagesto[3] (Al-Magiste), pelo qual ficou conhecido o tratado. Camões, no seu poema épico, refere-se a Ptolomeu: fala o Adamastor «Eu sou aquele oculto e grande cabo.../...Que nunca a Ptolomeu... fui notório...»[4]
... Mas o problema do movimento do Planeta Marte acabou por ser notório para Ptolomeu. Estando os planetas mais próximos da Terra do que das estrelas, parecem mover-se, ao longo do ano, entre as estrelas longínquas – as “estrelas fixas”. Esse movimento faz-se, geralmente, de oeste para leste ( ao contrário do movimento diurno que é sempre de leste para oeste). Mas em determinados períodos de tempo o movimento muda, passando a ser de leste para oeste. O movimento retrógrado pode durar vários meses (dependendo do planeta em questão), até que se torna mais lento e o planeta retoma o movimento normal (de oeste para leste). O movimento observado de cada planeta é uma combinação do movimento do planeta em torno do Sol, com o movimento da Terra também em torno do Sol. É simples de explicar quando sabemos que a Terra está em movimento, mas é difícil descrevê-lo num sistema em que a Terra está fixa – parada. Para o resolver Ptolomeu construiu um modelo geocêntrico mais completo. Explicou o movimento dos planetas através de uma combinação de círculos: o planeta move-se ao longo de um pequeno círculo chamado epiciclo, cujo centro se move num círculo maior chamado deferente. A Terra fica numa posição um pouco afastada do centro do deferente, isto é, o deferente é um círculo excêntrico em relação à Terra. Para dar conta do movimento não uniforme dos planetas, Ptolomeu introduziu ainda o equante, que é um ponto ao lado do centro do deferente, oposto à posição da Terra, e em relação ao qual o centro do epiciclo se move de modo uniforme.
O seu modelo ficou conhecido por “sistema ptolomaico” e orientou o pensamento astronómico durante 14 séculos.

Copérnico & Galileo

[1] Ptolomeu: Astrónomo, matemático e geógrafo grego, viveu em Alexandria, no séc. II (90-168 d.c.).
[2] Sistema Geocêntrico (Gr. Gê, Terra + kéton, centro), adj. diz-se do sistema em que a Terra é considerada como centro do movimento dos astros. O conceito foi dominante na astronomia durante toda a antiguidade e idade média.
[3] O Almagesto foi dividido em treze livros, os quais, resumidamente, tratam do plano do Sistema Solar, da tábua das cordas e alguns conceitos de trigonometria, do movimento do Sol e da Lua, da distância entre o Sol e a Lua, da construção do astrolábio, dos eclipses, das estrelas fixas catalogadas por Hiparco, da construção do globo terrestre.
[4] Lusíadas, V-L.

Monday, November 27, 2006

Breviário do pensamento cosmológico - da antiguidade clássica ao séc. XVI



(Cosmologia[1])

fig.1
Imaginamos o espanto e temor dos primeiros homens perante os “fenómenos celestes”, observáveis do seu abrigo nocturno. Um eclipse no luar de Janeiro…, o aparecimento de uma Supernova… mas desde sempre alguém manteve a curiosidade de observar o céu…, até que…
…Aristóteles[2] pensou um sistema de Universo perfeito, orbitando à volta da Terra – esta imóvel – no seu centro. O sistema era imutável, não tivera princípio, nem teria fim.
Nesta visão geocêntrica do Universo, os planetas Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno (os planetas então conhecidos), assim como o Sol e a Lua, perfaziam órbitas circulares perfeitas à volta da Terra, estando as estrelas fixas à esfera celeste.
No entanto, os planetas não descreviam um movimento uniforme em órbitas circulares. Por vezes o seu movimento mudava de sentido, parecendo que andavam para trás durante algum tempo, até retomarem a direcção original. Para resolver este problema foi introduzido o conceito de epiciclo. Para os gregos, a ideia do movimento circular vinha de se considerar que o círculo era a forma perfeita. Assim, às trajectórias circulares foram sobrepostas outras trajectórias circulares – os epiciclos – para que a observação e os cálculos matemáticos coincidissem. Mesmo assim, foi difícil para os astrónomos encaixar o caso do movimento do planeta Marte…

Copérnico&Galileo


fig.1 – o Universo Aristotélico: um Universo centrado na Terra, proposto por
Aristóteles, foi geralmente aceite como verdadeiro até ao séc. XVI, apesar de ter havido alguns filósofos gregos que pensavam que o Sol devia ser considerado o seu centro. O desenho é do séc. XVI, representando as posições relativas dos planetas, em volta dos quais se observa uma esfera de estrelas, que rodava uma vez por dia.
[1] Cosmologia (Gr. Kosmologia, tratado das leis finais que regem o Universo), ciência que estuda o Universo como um todo, incluindo a sua origem, a sua evolução e teorias do seu desenvolvimento futuro.
[2] Aristóteles (384-322 a.c.): filósofo da antiguidade clássica grega, discípulo de Platão, fundou depois a sua própria escola. As suas doutrinas influenciam o pensamento contemporâneo (a lógica, a ética, a política…).

Sunday, November 26, 2006

O Narigudo













A dança das gláxias
foto: Telescópio Espacial Hubble
(http//:hubblesite.org)


Um grupo de galáxias interage há vários biliões de anos.
Devido à sua proximidade, a influência das forças gravitacionais vai deslocando estrelas e alterando as suas formas. Num futuro, ainda longínquo, as galáxias poderão fundir-se numa só galáxia maior.
Sexteto de Seyfert é o nome do grupo e sugere ser constituído por seis galáxias. Mas, na verdade, apenas quatro entram na acção.
A pequena galáxia espiral, em cenário de fundo, no centro da imagem, encontra-se muito afastada do grupo e só por uma questão de ocasional alinhamento parece acompanhá-lo.
E o sexto membro do grupo não é uma galáxia mas sim uma longa cauda de estrelas libertadas por uma delas.
Contrariamente a muitos outros grupos de galáxias em contacto, que têm sido observados, este conjunto não mostra evidência das características regiões azuis de agregados de estrelas jovens, que normalmente se formam durante as interacções galácticas. Neste caso, pensa-se que tal facto se deve a que a observação surpreendeu as galáxias no começo da sua dança...
O Sexteto de Seyfert situa-se na Constelação Serpente, a 190 milhões de anos luz de distância.
Copérnico&Galileo

Friday, November 24, 2006

Os Cometas










(do grego Kométes, «astro cabeludo»)


Os Cometas são corpos celestes de reduzidas dimensões, se comparados com os Planetas. As suas órbitas podem ser parabólicas mas são a maior parte das vezes elípticas, em torno do Sol. Nunca foram observadas órbitas hiperbólicas[1]. O ponto da órbita em que o cometa atinge a menor distância em relação ao Sol chama-se periélio, sendo o inverso o afélio.
Os Cometas podem ser classificados quanto ao seu período: de curto período (como é o caso do Cometa Encke, com um período de 3,3 anos), de médio e de longo período (como o Hale-Bopp[2], que fez a sua aparição entre a Primavera de 1996 e a Primavera de 1997, com um período de 2400)
A sua massa pode variar entre algumas dezenas e alguns milhares de quilogramas. São constituídos por um Núcleo – rochoso, envolvido por camadas de gelo e poeiras. Em volta do núcleo têm uma camada superficial gasosa – a Cabeleira – e apresentam também uma Cauda, cuja direcção é orientada por acção do vento solar e é sempre oposta à do Sol, podendo atingir algumas centenas de milhões de quilómetros.
Actualmente pensa-se que são oriundos da parte exterior gelada do Sistema Solar.
Estes astros são visíveis da Terra quando passam nas proximidades do Sol, o que é devido à passagem de algum do seu gelo ao estado gasoso (sublimação), sendo reflectido pelo Sol.


Copérnico & Galileo

[1] Hipérbole: curva em que é constante a diferença das distâncias de cada um dos seus pontos, a dois pontos fixos chamados focos.
[2] Foto: Firma Copérnico & Galileo / minolta 820 cxi / 80-210 mm, nos céus de Portalegre

A "nova estrela" de 1572













O astrónomo dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601) anotou-a no seu diário, nesse ano de 1572: «uma noite, quando estava a contemplar, como habitualmente, a abóbada celeste, vi, com inexprimível espanto, perto do zénite, em Cassiopeia[1], uma estrela radiante de extraordinária magnitude». Brahe vira uma Supernova – a explosão de uma estrela no termo da sua existência.
A imagem, captada pelo Laboratório Espacial Chandra, põe diante dos nossos olhos, com um detalhe fascinante, os escombros gerados pela explosão da Supernova observada por Tycho Brahe em 1572.
As cores representam as diferentes emissões de raio X – vermelho, verde e azul, representando emissões de baixa, média e alta energia, respectivamente.
Uma onda de choque produzida pela expansão dos escombros é delineada por um arco azul de gás, exterior, à temperatura de 20 milhões de graus Celsius.
Os escombros da “estrela nova” são visíveis apenas em raio X e trata-se, provavelmente, de uma Supernova de tipo Ia – resultado da detonação e destruição de uma estrela anã branca.

Copérnico & Galileo

[1] Cassiopeia: constelação situada entre as latitude 90 e –20 graus; visível todo o ano no hemisfério norte, mas a melhor observação é no mês de Novembro; as sua estrelas principais formam um W, com o lado esquerdo em ângulo mais aberto.

Breviário do pensamento cosmológico - a revolução do telescópio




fig.1




fig.2


São duas revoluções seguidas: primeiro, Nicolau Copérnico publica a sua obra “De Revolutionibus Orbium Coelestium” (Tratado das Revoluções do Mundo Celeste), arrasando as teorias geocêntricas de Aristóteles e Ptolomeu, que consideravam a Terra o centro do Universo; depois dá-se a invenção do telescópio – a astronomia entra na época moderna.
É no ano de 1609 que, na Holanda, três nomes aparecem ligados à invenção de um instrumento que permitia ver os objectos à distância como se estivessem muito perto – Hans Lipperhey, Jacob Metius e Sacharias Jassen. A sua relação com o fabrico de lentes e o seu aperfeiçoamento, levara à invenção do telescópio – nome pela primeira vez utilizado por Frederico Cesi em 1611.
Mas é Galileo Galilei[1], então professor de matemática na Universidade de Pádua, que tem a noção imediata do seu interesse e valor. Chegando a notícia rapidamente a Pádua, Galileo torna o instrumento famoso, tendo desenvolvido um método de ajuste de lentes que lhe permitiu construir e usar esse instrumento na observação astronómica. Em Junho de 1609 constrói o seu primeiro telescópio com um poder de aumento de 3 x, em Agosto do mesmo ano apresenta no Senado de Veneza um instrumento com uma capacidade de aumento de 8 x e em Novembro seguinte tem já construído um telescópio com um aumento de 20 x.
É com este instrumento, no decurso do ano seguinte, que Galileo abala o mundo com os seus relatos: a superfície da Lua tinha montanhas e vales bastante parecidos com os da Terra – afinal a Lua não era uma luz perfeita como Aristóteles reivindicara. A Via Láctea era constituída por uma imensidão de estrelas, espalhadas através do céu, e não por gás luminoso, como até então se pensava. Pouco depois chega a descoberta astronómica mais importante de Galileo – entre Dezembro de 1609 e Janeiro de 1610 – a primeira observação das luas de Júpiter, à quais Galileo chama “planetas medicianos” – anunciada no seu trabalho Sidereus Nuncius (Mensageiro das Estrelas) publicado em Veneza, em Abril de 1610, e dedicado à família Medici (Medicea Sidera), o que tem influência no seu regresso à Toscana como filósofo e matemático do Grande Duque Cosimo II, em Florença.
Logo a seguir descobre-se que Vénus tem fases, como a nossa Lua, observação que, com a variação de tamanho que Galileo mede, é uma clara indicação de que se move em torno do Sol e não da Terra. Observa-se também que o Sol tem manchas.
Galileo é considerado o fundador do método experimental. Estabeleceu a lei da aceleração uniforme da queda dos corpos e a lei do isocronismo das pequenas oscilações do pêndulo, entre outras, tendo conseguido traduzi-las matematicamente. Também a ele se deve a invenção do microscópio.
Abraçou publicamente a teoria de Copérnico de um Universo heliocêntrico, como o sublinha em correspondência com Kepler: «desde há muitos anos que estou de acordo com a teoria de Copérnico...»
As suas opiniões sobre os movimentos da Terra foram denunciadas do púlpito da Catedral de Florença, por serem erróneas e contrárias às “sagradas escrituras”. Em Outubro de 1632 foi pronunciado e condenado pelo tribunal do Santo Ofício de Roma, sendo obrigado a abjurar solenemente as suas convicções científicas.

Copérnico & Galileo


fig.1 A primeira ilustração conhecida de um telescópio. Giovanpattista della Porta desenhou este esquema numa carta escrita em Agosto de 1609.

fig.2 Telescópios de Galileo.
[1] Galileo Galilei: matemático, astrónomo e físico, nasceu em Pisa em 1564 e morreu em Arceti em 1642, mais conhecido pelo desenvolvimento e uso do telescópio na astronomia.